Auf Wiedersehen, Deutschland!
Última modificação: 06/05/2020
Hoje é meu último dia na Alemanha. Não faz tanto tempo assim que eu cheguei, mas parece que faz um tempão que saí de casa. Eu resolvi vir para cá principalmente para estudar. A intenção inicial era evoluir academicamente, o máximo possível, e praticar meu conhecimento da língua alemã. No final das contas, eu acabei fazendo isso mesmo, mas não bem como eu queria.
Como alguns de vocês puderam acompanhar, desde o começo as dificuldades surgiram. A verdade é que surgiram bem mais do que eu imaginei e, na medida do possível, fui contornando-as. Meu maior problema foi a demora na entrega dos materiais que eu precisava para estudar. A cada aula os professores passavam novos slides a serem lidos, capítulos de livros, artigos. Alguém precisava adaptar esses materiais para mim, ou seja, colocar em um formato digital, descrever imagens, escrever fórmulas matemáticas de uma forma que eu pudesse lê-las com o meu leitor de telas, etc. Eu sei que esse processo demora. Meus pais já fizeram muito isso para mim e eu sei o trabalho que dá, e eu já esperava uma demora, mas nunca me passou pela cabeça que eu teria que esperar tanto. Por sinal, tem coisas que espero até agora, mas já é tarde demais.
Sempre que eu recebia um material novo, eu enviava para as pessoas responsáveis por adaptar os materiais. Desde o começo do semestre fui atrás de tudo que eu precisaria para o semestre inteiro, para agilizar o processo. Uma das matérias, nunca recebi absolutamente nada, e já larguei no primeiro mês. A segunda, fui recebendo pouco a pouco, e acabei o semestre com 6 slides de 21, o que me deixou com a esperança o semestre inteiro de conseguir fazer a prova no fim. Mas sem como estudar, como é que vou fazer uma prova? Larguei também.
Em um texto anterior eu postei as matérias que eu iria fazer. As duas que tive que largar, por não receber o material, foram aprendizado de máquina e visão computacional. Uma pena ter largado essa última, porque eu estava me interessando muito pelo assunto e o pior é que eu nem sei porque eu não recebi esses materiais. Falta de gente para trabalhar? Esqueceram? Não era possível fazer a adaptação? Eu não sei. Esse lugar, um dos poucos do mundo que lidam com isso, os materiais que recebi adaptados, tinham uma qualidade incrível, isso não posso negar. Mas acho que faltou um pouco mais de transparência da parte deles de como tudo isso funcionava, gostaria de ter sido melhor bem informado sobre o que se passava. No entanto, o saldo positivo foi interessante. Na matéria de robótica, fiquei a um passo de tirar a maior nota de todas, não porque eu recebi os materiais, mas sim porque estudei com dois grandes amigos, Mathias e Marcelo, que literalmente fizeram eu aprender tudo lendo os materiais para mim. Valeu mesmo, caras!
Já na matéria de Speech Recognition, tirei uma nota ótima também, porque foi a única matéria que recebi todos os materiais que eu deveria receber. Me esforcei, estudei e deu resultado. O que indica fortemente que quando temos uma chance se quer, a gente pode tentar e conseguir.
No curso de alemão, que eu fazia oito horas por semana, eu recebi por volta de 40 páginas de aproximadamente 200 que o livro tinha. Eu tinha dois professores, e um deles começou a digitar as páginas dos livros que iríamos usar; a ele sou muito grato, várias atividades extras eu não fiz, e na real eu já tinha desistido na metade de janeiro de fazer a prova. Minha namorada me convenceu: - “O que você tem a perder em fazer a prova?"- E foi com esse pensamento que fiz a prova, e tirei quase a maior nota novamente.
Quando sento aqui e penso, o que mais eu poderia ter feito? Porque sempre há algo mais que podemos fazer, não importa a situação. E algumas coisas que eu fiz, mas não foram suficientes. eu fico chateado com essa situação, e alguns amigos interpretam errado, achando que eu estou me culpando. Não estou me culpando, e nem estou culpando as pessoas que disseram que arrumariam os materiais para mim e não arrumaram. Eu analiso a situação: Eu fiz a matéria ou não? A resposta é: não, e é isso que me chateia. Eu queria muito ter feito e aprendido.
Mesmo com esses contratempos, eu gostei demais dessa experiência. Ter morado sozinho me deu várias idéias do que eu quero para minha vida, e como quero que ela seja. Para quem um dia se perdeu quase na porta de casa, porque estava nevando e colocou o capuz para se proteger, e perdeu todo o sentido da audição e teve que esperar um amigo que estava chegando em casa vir buscá-lo, dois meses depois essa pessoa estava em um passado distante, e nem acreditaria que ela mesma estaria indo buscar o motoboy que trazia a comida, que havia se perdido quase na porta da casa dela. Para quem não sabia fazer absolutamente nada na cozinha, chegou até a ser cômico 3 meses mais tarde explicar passo a passo para outra pessoa como fazer um macarrão a carbonara. Nada disso seria possível se eu não tivesse recebido ajuda de várias pessoas. Fica registrado aqui o meu muito obrigado para todos os amigos que fiz na Alemanha. Agradeço os meus pais, que apoiaram e financiaram boa parte dessa empreitada, já que a minha bolsa não era tão grande assim. Agradeço a minha namorada Thaisa, por estar todos os dias comigo no skype me apoiando como fosse (ou sendo apenas linda, especialidade dela :P ). E por último, mas não menos importante, meu agradecimento especial ao Marcelo e a Milena, o casal que mais esteve junto comigo nesses últimos 7 meses, seja indo almoçar no Mensa, estudar, me ensinar a cozinhar algumas coisas, ir no mercado, e me abrigarem alguns dias no final do intercâmbio depois que eu tive que deixar o meu quarto, vocês são foda! E se tem algo importante que eu trouxe comigo dessa viagem foi, mesmo que eu não esteja fazendo realmente o que eu queira porque não tive as chances que precisei, eu vou fazer qualquer outra coisa. Porque o mundo está cheio de coisas que eu quero fazer, e se eu fosse fazer tudo, eu teria que viver mais de uma vida para terminar. É só não ficar parado. A vida continua. A vida acontece.
PS: Terminei de escrever esse texto no Brasil e só estou publicando hoje, mas saí da Alemanha no dia 4 de abril.
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