[A Saga do Cão Guia] - Epílogo
Última modificação: 04/05/2020
(Demorei para escrever, mas considerem que esse texto foi publicado no dia 2 de abril, e as datas se referem as duas semanas anteriores) A segunda-feira da semana passada começou de uma maneira bem diferente. O que não era esperado apareceu, e tivemos um pouco de neve. Não era aquela coisa que muita gente quer ver, vários flocos caindo, montes de neve no chão, e guerras de bolas de neve por todos os lados. Eram flocos bem pequenos, que batiam no seu rosto, viravam água, e te congelavam inteiro. Neve é uma coisa que só turista gosta, e só nos primeiros dias. Primeiro é a coisa mais linda do mundo, depois passa a ser normal, e por último só incomoda mesmo. Se você não conhece neve ainda, espere só pra ver. E como eu não estou aqui para turismo, e precisava ficar caminhando várias quadras, a neve não era uma coisa bacana, a minha sorte que durou bem pouco.
Na quarta-feira da semana passada fizemos algumas rotas sozinhos. Já tínhamos noção de como eram as ruas ao redor da escola, com sinaleiros, os cruzamentos, então largaram a gente perto e a gente tinha que voltar. Não foi tão difícil assim, porque a distância era bem pequena. Complicado foi a rota que tivemos que fazer nessa terça, onde soltaram a gente em uma distância considerável, e deveríamos voltar pedindo informações e com nosso próprio conhecimento da região. A princípio eu e meu parceiro de caminhada pensamos que nos daríamos bem usando o gps do telefone dele, afinal, a idéia era simular uma situação real, e em uma situação real ou você pergunta para pessoas ou usa o seu smartphone. Mas o que tinha pra dar errado? Tudo, é claro. A gente se perdeu e andamos em círculos, sabem por quê? Graças o estúpido telefone dele que deu as direções erradas, hahahahaha.
Depois de andarmos em círculos, atravessar uns caminhos meio undergrounds, pedimos umas informações e chegamos no destino com facilidade. Já cheguei falando pros outros estudantes: ‘Tinha que ser o cara da California!!’ - Enquanto ele jogava a culpa em mim por ser brasileiro. Esse cara é muito engraçado, a gente se diverte um monte junto. Segundo ele não nos perdemos, porque sabíamos onde queríamos ir; O que fazíamos era descobrir novos lugares. Vou concordar com ele :P Essa caminhada foi a mais instrutiva de todas que fizemos, na minha opinião. Deu para ter uma idéia como é andar com o cão guia, sem qualquer comentário do seu instrutor, embora eles estivessem a uma quadra observando tudo. Às vezes seu cachorro para abruptamente, e você tem que saber se ele está cheirando um arbusto, está distraído com algo, ou está tentando mostrar-lhe algo, um galho de árvore para ser desviado, o meio-fio, um buraco que não tem como passar, etc. Dependendo do que ele estiver fazendo, sua reação será diferente, para lidar com aquilo. Não é fácil, e toma tempo para aprender isso.
Quinta-feira da semana passada foi um dos melhores dias, com certeza. Fomos a Manhattan, e aprendemos como entrar em um trem, pegar metrô, andar sobre as plataformas com o cachorro, atravessar catracas, e claro, andamos em uma cidade cheia de gente. É interessante andar em um ambiente assim, que me lembra bastante o centro de Curitiba, e ver como o seu cachorro reage. Eu achei a caminhada muito agradável, e consegui tirar umas fotos ao lado do Central park, entre outros pontos turísticos. Tento upar elas depois para vocês. Como eu fiquei procrastinando quase duas semanas para escrever esse post, estou lembrando de muitas coisas novas que eu deveria citar, mas isso aqui ficaria gigante e vou focar nas mais interessantes. E com certeza, o melhor dia foi o sábado.
No sábado foi a nossa graduação. Os que estavam aqui pelo segundo cachorro iriam embora nesse dia, e os que estavam pelo primeiro ficariam mais uma semana. A graduação é importante para mostrar para os voluntários, doadores e colaboradores em geral da escola o trabalho que está sendo feito, e o que a ajuda deles conseguiu fazer. E claro, para recebermos nosso diploma depois de 3 semanas de trabalho duro. Quando perguntaram da nossa turma quem gostaria de falar algumas palavras nesse dia, eu pensei uma, duas, três vezes, mas enfrentei meu medo de fazer um discurso em inglês para 100 pessoas. Me senti na obrigação em agradecer tantas pessoas que me ajudaram nesse processo, e a única maneira que eu imaginei que fosse eficaz seria com palavras. Então escrevi um texto em português, um idioma que eu domino e me sinto confortável em escrever um discurso, e pedi para meus amigos <a href="http://twitter.com/TeacherTchelo">Tchelo e <a href="http://twitter.com/CarineIdril>Carine traduzirem para mim. Meu muito obrigado aos dois!!! Aí vai, a versão em inglês e logo em seguida a tradução:
Since I watched the movie The Butterfly Effect, I sometimes think about some actions that I take and their consequences. In this movie the theory which supports the fact of the simple flapping of a butterfly’s wings on one side of the planet can cause a hurricane on the other. Of course, this is a metaphor. It means that small actions can have big effects, which can be a long term effect or very far from us. In my case, I never got to see this in practice. Some small action that I have taken, became a big event, even because it’s not something easy to trace. When I arrived here at Guiding Eyes, I started watching everything that was around me. I started to understand all the dedication that was necessary for all this work. And today, I tell you, I could see the result of the set of actions of several people. I’m certainly safe to say that the flapping of wings in New York created a hurricane that will go throughout the United States and even Brazil. These hurricanes are every person with their guide dog, who will surely have a new life. A better life, a more independent life, a life with new possibilities. And it was possible only because of you, Puppy Raisers, volunteers, donors, Guiding Eyes staff and instructors. My colleagues and I thank you all today for all you dedication and effort. We are proud to be part of it. Many of you participated in this journey helping in different ways, sometimes without even knowing who you would be helping. This is something that I want to carry with me wherever I go, to help people whenever I can, and maybe one day drastically change someone’s life as you have changed mine. Again, my thanks to all.
Desde que assisti o filme efeito borboleta, as vezes paro para pensar as causas de certas ações que eu tomo e suas consequências. Neste filme, é abordada a teoria que o simples bater de asas de uma borboleta em um lado do planeta, pode causar um furacão no outro lado. Claro, isso é uma metáfora. O que isso quer dizer é que pequenas ações podem ter grandes efeitos, a longo prazo ou muito distante de nós. No meu caso, eu nunca consegui ver isso na prática; Uma pequena ação que eu tenha feito se transformar em um grande acontecimento, até porque isso não é fácil de rastrear. Quando cheguei aqui, na Guiding Eyes, eu comecei a observar tudo que estava ao meu redor. Comecei a perceber toda a dedicação que era necessária para que tudo isso funcionasse. E hoje, eu digo para vocês, que eu consegui ver o que o conjunto de ações de várias pessoas resultou. Estou certamente seguro em dizer que o bater de asas em New York criou um furacão que irá para todo os Estados Unidos e até mesmo para o Brasil. Esses furacões são cada pessoa com o seu cão guia, que com certeza terão uma nova vida. Uma vida melhor, uma vida mais independente, uma vida com novas possibilidades. E isso só foi possível graças a vocês, Pupy Raisers, voluntários, doadores, Guiding Eyes staff e instrutores. Eu e meus colegas agradecemos a todos hoje, por toda sua dedicação e e esforço. Estamos orgulhosos em fazer parte de tudo isso. Muitos de vocês participaram dessa jornada, ajudando de muitas maneiras diferentes, as vezes sem nem mesmo saber a quem estariam ajudando. Isto é algo que eu quero carregar comigo onde quer que eu vá, ajudar as pessoas sempre que eu puder, e talvez um dia mudar drasticamente a vida de alguém, como vocês mudaram a minha. Mais uma vez, meu muito obrigado a todos.
E acho que me saí bem, consegui fazer algumas pessoas chorarem :P
O momento mais emocionante desse dia foi quando eu conheci os puppy raisers do meu cachorro. Os puppy raisers são voluntários que tomam conta dos cães até que eles atinjam por volta de um ano e dois meses de idade, ensinando o cachorro boas maneiras, socializando o cachorro (levá-lo para lugares diferentes, conhecer outros cães, pessoas, enfim, acostumá-lo com o mundo a fora). Sem essas pessoas, ter um cão guia não seria possível. O trabalho deles é muito importante, e eu fiquei muito feliz de conhecer as pessoas que cuidaram do Timmy. Gostei de agradecê-los pessoalmente pelo que fizeram, e eles me desejaram felicidades na minha jornada de volta para o Brasil. Eu gostaria de falar mais sobre esse assunto, mas esse post está enorme. Eu acho que o meu texto de agradecimento que postei acima dá para ter uma idéia da importância dessas pessoas.
Nessa sexta-feira retornei para o Brasil em uma viagem de mais de 14 horas. O Timmy passou o tempo todo deitado entre os meus pés, muito tranquilo. Eu pensei que ele ficaria agitado, mas ele se comportou muito bem. Agora já estou em Curitiba, andando todo dia com ele, praticando cada vez mais, até nos tornarmos uma dupla perfeita. Os 6 primeiros meses é onde os principais ajustes serão feitos. Temos muitas coisas para trabalhar juntos até que ele se acostume totalmente com tudo, nova rotina, e claro, melhore mais e mais a maneira que ele me guia. Mas tenho gostado muito. é algo difícil de por em palavras, acho que só vendo a minha felicidade ao andar com ele por aí para entender. Chegamos ao fim da saga do cão guia, uma saga que começou a muito tempo atrás, e que tem um fim quando pisei ao Brasil. Essa saga continua com certeza, com outro nome, onde novas histórias virão…. Meus agradecimentos a Guiding Eyes for the Blind, aos Puppy Raisers que cuidaram do Timmy tão bem, aos voluntários, instrutores, doadores que ajudaram a escola de tantas maneiras diferentes. Agradeço também aos meus pais, que sem eles eu nunca teria chegado onde eu cheguei; Foram as pessoas que me proveram todo o necessário desde que eu era pequeno, tanto intelectualmente e como parte da família, sempre achando uma maneira de me ajudar a superar minha deficiência. E vocês que acompanharam esse blog, deixando comentários ou apenas lendo, me dando um motivo para escrever. Obrigado a todos!!!
Comentários do Discuss estão desativados.